quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Sortudo e bom de cama



Com um homem desses solto por aí, solteiro, lindo, bem educado e bom de cama, o livro deveria se chamar “uma mulher de sorte”

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               Comecei a ler Um homem de sorte, de Nicholas Sparks, por causa do comentário de uma leitora do blog Observatório Clube de Autores, para o qual também escrevo ( http://observatorioclubedeautores.blogspot.com.br/  ). Somente por isso. Confesso que, antes desse fatídico acontecimento e enquanto leitor compulsivo do sempre bom senhor Sparks, vi o livro na vitrine da única livraria de minha cidade, tive o desejo de comprar, mas logo desisti. Isso foi um pouco depois do livro ter chegado ao Brasil. Depois o filme foi anunciado, provavelmente assistirei, mas com toda certeza evitarei fazer comparações com o livro – ou pelo menos não as escreverei no meu blog. Um longo tempo até agora. Comprei o livro no sábado passado pela manhã – e hoje, quarta feira, terminei de lê-lo. Cinco dias. Um recorde pessoal. E mais um bom livro do aclamado senhor Sparks.
                Com o perdão da referência, o melhor de Nicholas está neste livro. É uma história de amor meio boba, e que se torna extremamente verossímil nas mãos do rei do drama familiar. Não há ninguém morrendo de câncer aqui, nem avançando lentamente por um caminho de Alzheimer, muito menos com a culpa da morte de alguém nas costas (se bem que Nana sofreu um AVC)... Apenas um homem perturbado pelos horrores da guerra (Logan Thibault) e uma professora primária encalhada há dez anos (Elizabeth/Beth), graças ao marido (Clayton) que afasta seus pretendentes. Esses são os três principais personagens sobre os quais a trama se constrói, como já imaginamos, colocando Beth e Logan de totais estranhos a amantes insaciáveis. Sim, você não leu errado minha senhora. Insaciáveis. Em duas ou mais partes do livro Nicholas afirma que os dois “passaram a noite fazendo amor”. Minha nossa senhora! Também, para alguém que viajou a pé do Colorado até Hampton, aprofundar-se umas cem vezes numa viajem um pouco menor não me parece problema algum. Além dos três, o filho de Beth (Ben), a avó (Nana) e o pastor alemão comprado por Logan pessoalmente na Alemanha (Zeus) somam o resto do elenco.
                Clayton – o primeiro personagem a aparecer, antes mesmo de Thibaut – é o típico ex marido recalcado, que não suporta ver mulher com outro homem e faz de tudo para que ela continue sozinha. Ele, por outro lado, pode – e tem – quantas namoradas desejar. Também é um policial arrogante e imbecil (sugestivo, né), que, protegido pela força do pai, não precisa justificar seus atos – o tal personagem lixo, feito somente para ser odiado. Nana faz o já conhecido papel da idosa saliente, que não tem trava na língua e é muito divertida – um dos melhores personagens. Logan é ex fuzileiro, do tipo calado e introspectivo belo/gostoso/recalcado(?)/irresistível. Beth é a professora que criou o filho praticamente sem o pai – com a ajuda de Nana. Ben é o garoto inteligente e sensível, que detesta futebol e prefere livros e violinos (além de piano). Por fim, Zeus é o cão – talvez o mais carismático deles. Sparks nomeia cada capítulo com o nome de um ou dois personagens, os que mais se destacarem naquela passagem em específico. Os capítulos tem variação de tamanho, de duas a vinte e quatro páginas. Percebe-se que o tamanho dos mesmos diminui com o aproximar do fim do livro. Os melhores são os que tratam da vida cotidiana dos personagens, e os piores são os que descrevem o passado de Logan enquanto fuzileiro – quebram com o clima doce do livro e trazem a ação, mas simplesmente não gostei, achei chato e desestimulante. Parece romper com a proposta do tema inicial. Esquecendo isso, a maneira como Sparks conta a história é maravilhosa. O nascer da paixão de Beth por Logan, a aproximação dos dois, as investidas dela – sim, porque se esperasse por ele acho que nada aconteceria. Tudo flui perfeitamente até o conflito que, inevitavelmente, os separaria. Aí o leite azeda.
                Como já disse antes, o melhor de Nicholas está aqui. Uma escrita concisa e madura, com o desenrolar da história o mais familiar possível. Sparks quer que você conheça os personagens, se apaixone por eles ou os odeie na medida em que vai construindo o romance. O gancho até que é interessante, e deixa um quê de o que vai acontecer depois? O problema é que tal gancho cria também um buraco negro, que culmina com o principal conflito do livro: a foto. Logan utilizou-se de uma foto para chegar até Beth, e até aí tudo bem, aceitaria isso com tranqüilidade, sem maiores questionamentos. Não me importa se o homem é melhor do que os melhores satélites da NASA em localizar pessoas, isso não me incomoda em nada. O problema é que a tal foto se torna o pivô da separação de Beth e Logan logo após ela descobrir que ele carregava tal artefato, mas não a tinha mostrado à ela, nem contado o porque de sua aproximação. Nesse ponto Sparks até que se esforça em construir um bom motivo, com argumentos à altura, mas simplesmente não convence. Pera lá, né? Stella Porto, no fim das contas, tinha razão. “Dar chilique” com o namorado porque ele não contou que chegou até ela por causa de uma foto? Terminar por isso? Acreditar, depois de um pouco de veneno do ex marido, que Logan era um sociopata? Pelo amor de Deus, Nicholas, onde está o conflito verdadeiro? E o questionamento de valores? Nada? Só por causa de uma foto? Além disso, todos se perguntam: por que raios ele não contou desde o início o motivo de sua chegada a Hampton à Beth? Numa das passagens do livro Sparks escreve que Logan também se questionou sobre isso, mas não obteve uma resposta. Não convenceu. A trama também é um pouco mal aproveitada. Os pesadelos de Logan logo tomam importância secundária na trama, e Sparks simplesmente não cria um único conflito sobre isso. Os capítulos finais são os mais corridos, talvez com a intenção de dar agilidade à trama, mas o efeito é desastroso. O livro começa com um ritmo familiar e termina como fim de feira, com direito a cenas mal explicadas de morte (de propósito) para depois tentar nos surpreender. Além disso, a falsa redenção de Clayton não convence ninguém. Foi só para tirá-lo do caminho de Beth mesmo. De resto, tudo é de Nicholas. Divertido, envolvente e interessante. Só o título tinha de ser diferente. Afinal, Beth parece ser a sortuda ali.
 

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